Veja aqui a Agenda da Câmara Municipal de Mortágua, edição de agosto de 2012. Na rubrica "Mortágua: pessoas, histórias e lugares", é recordada a encenação do "Auto do Juiz de Fora", há 20 anos atrás.
Foi há 20 anos que
Mortágua assistiu à representação de uma grandiosa peça teatral - “O Auto do
Juiz de Fora”, baseada no acontecimento lendário que desde tempos imemoriais
está associado ao concelho de Mortágua. A ideia partiu da Câmara Municipal para
assinalar os 800 anos sobre a atribuição da 1ª Carta de Foral a Mortágua, concedida
em 1192, por D. Dulce, esposa de D. Sancho I. O espetáculo escrito, encenado e
musicado originalmente, foi apresentado ao ar livre na Quinta de S. Domingos,
no dia 29 de agosto de 1992. Tratou-se da recriação teatral de uma lenda quase
tão antiga quanto a terra e que remonta a cerca de 600 anos, em plena Idade
Média. Resumidamente a lenda é esta:
o rei destacou para
Mortágua um juiz (daí a designação de Juiz de Fora) para administrar a justiça.
Mas este juiz era discricionário e abusador na aplicação da justiça, protegendo
os ricos e perseguindo os pobres. A gota de água terá sido o enforcamento de um
homem inocente e a decisão de destinar apenas um açoite a um fidalgo assassino.
O Juiz apareceu morto. Foi enviado um representante do rei para prender o culpado
ou culpados de tão grave ato, como era o assassinato de um representante da
magistratura. Reunido o povo, na época seriam poucas pessoas, o inquiridor fez
a pergunta, com toda a sua autoridade: quem matou o juiz? E o povo, com
bastante astúcia e inteligência, terá respondido em uníssono: “Foi Mortágua”. Não
podendo prender todo um povo, o inquiridor terá ido embora, sem haver qualquer
culpado. Se os factos terão ocorrido e em que circunstâncias, não há certezas,
nem documentos escritos que os sustentem, apenas suposições e a tradição oral
que perdurou ao longo dos tempos. As lendas combinam muitas vezes factos reais
com factos fictícios ou fantasiados alimentados pelo imaginário popular,
servindo para explicar o inexplicável. E como quem conta um conto aumenta-lhe
um ponto... Episódio lendário ou histórico (?), o que é certo que a lenda passou
a representar o imaginário heroico de um povo que no distante século XIV
resolveu fazer justiça e lutar pela sua dignidade. O espetáculo com texto de
Pedro Castro e encenado por Bento Martins, mobilizou cerca de 150 pessoas, entre
atores, cantores, dançarinos e técnicos, pertencentes a cerca de 40 coletividades
do concelho, num palco de cerca de 750 m2. O guarda roupa foi feito com grande
rigor histórico da época, utilizando 1000 metros de tecido. O cenário,
construído com madeira do concelho, recriou com fidelidade o ambiente da época medieval.
A representação constituiu uma grandiosa manifestação cultural e artística, mas
serviu também, de alguma forma, para desmistificar o “fantasma ” com qual os mortaguenses
se acostumaram conviver desde tempos ancestrais, assumindo a lenda, sem
complexos ou preocupação de expiar qualquer sentimento de culpa. O que ressalta
é a mensagem de união de um povo e o triunfo do ideal de justiça. No final da
peça não se desvenda o mistério. A dúvida sobre "quem matou o juiz"
vai perdurar. A lenda do Juiz de Fora persiste na memória dos mortaguenses e
faz parte do património cultural do concelho. Ainda hoje há referências locais
com alusão à lenda: “Pensão Juiz de Fora”, “Campo Juiz de Fora”, jornal escolar
“Juiz de Fora”.
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